sábado, março 21, 2009


Eu já morri muitas vezes...
e é ainda da Vida que tenho mais medo.

Sou um estilhaço!
Partida em pedaços, não sou sequer a sombra de quem fui,
mesmo que a minha essência esteja em cada parte de mim.
Não consigo mais juntar as partes desfeitas.
Elas, simplesmente, se recusam a encaixar.
Sei como eu fui e quem fui.
Só não sei onde me transformei nos pedaços que sou hoje.
Procuro pedaços de mim em cada canto e cada gesto.
Nada encontro.
Me espalhei em cada vida que entrou na minha vida.
Fui deixando partes de mim para trás,
na vã ilusão de estar aparando as arestas,
tirando de mim o que desagradava aos outros,
sem notar que eu era a estrutura que se dilacerava.
Sem notar que estando em pedaços, não sou nada.
Na ânsia de agradar, me corrompi, me deixei humilhar, me desfiz!
Pois agora, irei transformar cada estilhaço de mim que encontrar.
Unirei todas as peças e formarei um mosaico de mim mesma!
Então, se quiserem me odiar,
que me conheçam em grandes partes;
mas, se quiserem me amar,
que me amem por cada pedacinho...

Turista na vida

Paixão Única


Quem me dera poder ver-te
Ai! Quem me dera dizer-te
Que pude amar-te e perder-te
Mas olvidar-te... isso não!
Que no ardor de outros amores,
Senti vivas sempre as dores
Duma remota paixão.

Com que dorida saudade
Penso nessa mocidade,
Nessa vaga ansiedade
Que soubeste compreender!
E tu só , só tu soubeste
Que, num mundo como este,
Qual florinha em penha agreste,
Pode a flor d'alma morrer.

Orvalhaste-a, quando ainda
Ao nascer, singela e linda,
Respirava a esp'rança infinda
Que consigo a infância tem.
Amparaste-a, quando o norte
Das paixões, soprando forte,
Lhe quis dar rápida morte
Como à cândida cecém!

E depois nuvem escura
Lá no céu desta ventura
Enlutou-me a aurora pura
Dos meus anos infantis.
Nesta vida houve um espaço
Onde nunca dei um passo
Em que não deixasse um traço
De paixões torpes e vis!

E não tenho outra memória
Que me inspire altiva glória
Mem outro nome na história
De meus delírios fatais.
Se percorro a longa escala
De paixões que a honra cala,
Quem dum nobre amor me fala
És só tu... e ninguém mais!

És só tu! De resto, apenas
Nestas variadas cenas
De ilusões e inglórias penas
Nada sinto o que perdi!...
Sinto bem esse desdouro
Que comprei com falso ouro,
Em desprezo dum tesouro
Que só pude achar em ti!

Camilo Ferreira Botelho Castelo Branco